Dificuldade de acesso aos locais atingidos impede levantamento detalhado sobre o tamanho do impacto na produção rural. Prejuízo estimado pela Confederação Nacional dos Municípios é de R$ 570 milhões no setor produtivo gaúcho
O levante de estragos movido pela enchente devastou cidades inteiras no Rio Grande do Sul e parte importante da agropecuária gaúcha. Os impactos nas zonas rurais são tantos que sequer conseguem ser precisamente mapeados, mas já dão pistas de um cenário duro de perdas. Levantamento da Confederação Nacional dos Municípios (CNM) estima prejuízos de R$ 570 milhões na produção —R$ 435 milhões no setor agrícola e R$ 134,7 milhões na pecuária.
A Emater-RS ainda não tem dados sobre a dimensão dos estragos. E isso se dá pela própria dificuldade de se ter acesso às informações. Há muitas propriedades rurais que estão completamente isoladas no Estado.
— Quantificar, neste momento, é completamente inviável em razão do tamanho do problema, principalmente nos locais mais afetados. Estradas rurais estão com bastante dificuldade de acesso e os técnicos precisam conseguir chegar aos locais — situa o diretor técnico da instituição, Claudinei Baldissera.
Mas já se sabe que os impactos vão das lavouras à pecuária de corte e de leite. Em pontos aonde a água não chegou, a dificuldade de acesso viário afetou a alimentação de animais, impedindo o transporte de ração. Em outros pontos afetados pela falta de luz, o apagão inviabilizou a produção de leite e milhares de litros foram jogados fora. O Sindicato das Indústrias de Laticínios e Produtos Derivados (Sindilat-RS) projeta que até 40% da coleta diária de leite foi afetada no Rio Grande do Sul.
— O impacto é o pior possível, nunca vimos isso acontecer — descreve o presidente da Federação a Agricultura do Estado (Farsul), Gedeão Pereira.
A federação está em contato com os sindicatos rurais para mapear onde são necessários os esforços neste momento em que os resgates ainda são prioridade. Uma avaliação real sobre os danos deve ser feita posteriormente.
Na agricultura, os prejuízos atingiram em cheio algumas produções de folhosas e hortifrútis em geral, principalmente na serra gaúcha. Na soja, principal cultura de produção no Estado, os danos mais severos estão localizados no Litoral, em toda a faixa que se estende de Torres a Santa Vitória do Palmar.
O progresso na colheita do grão chegou a 78% nesta semana. Ainda faltam 1,46 milhão de hectares a serem colhidos. Desta parcela que resta, boa parte deve resultar em grãos de qualidade inapropriada. Segundo Baldissera, espera-se uma quebra de 20% a 100% (com perda total da lavoura) nos locais de colheita tardia em que a enchente chegou com força, sobretudo nas regiões de Santa Maria e na zona Sul.
Para o presidente da Farsul, as expectativas de recorde de produção nesta safra, por óbvio, não devem ser batidas diante das perdas. Ainda assim, o resultado colhido deve ser superior ao ciclo passado, ainda impactado pela recuperação da estiagem. Isso porque no Norte, importante região produtora, a colheita do grão já havia avançado.
— Olhando o copo meio cheio, temos municípios que já haviam colhido praticamente tudo. Uma fração preponderante já estava garantida. Com certeza, ainda que considerada a quebra no que não foi colhido, a curva comparativa será superior ao ano passado. Este é o lado bom da notícia — acrescenta o diretor técnico da Emater.
No arroz, que tem no RS 70% de toda a produção nacional, as lavouras estão 84,2% colhidas, segundo o Instituto Rio Grandense do Arroz (Irga), reduzindo a dimensão de impacto. Das áreas que foram afetadas, estima-se 22,95 mil hectares totalmente perdidos, a maior parte na Região Central.
As estimativas sobre as perdas totais no campo vão sendo traçadas à medida que se conhece a situação. O economista e membro do Insper Lucas Borges cita estudos que falam em 1,5 milhão de toneladas de produção perdidas pela cheia. Os números não são definitivos e tendem a aumentar. Há ainda preocupação com o que sequer pôde ser mensurado, como os estragos em infraestrutura e os efeitos disso em logística.
— O problema é muito grande porque vai impactar não só o Brasil, mas também outros países por tudo o que o Rio Grande do Sul abastece — antecipa o pesquisador.
Antes mesmo do dano em produção, as entidades do setor atentam para o impacto social que a enchente trouxe para o campo. Há muitos agricultores que perderam tudo o que tinham. O cenário é “devastador”, nas palavras do diretor técnico da Emater.
— Nosso papel fundamental é a assistência social rural. Será o nosso foco prioritário. Olhar para as pessoas para que elas sintam que a atividade agrícola, ainda que com todas as intempéries, seja vista como importante — reforça Baldissera.
Fonte: GZH
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